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quarta-feira, 27 de abril de 2011

Amar



Amar não é, necessariamente, escutar Roberto Carlos e chorar. Vou logo avisando. Isso é crise existencial, viadagem de quem sente. Amar é menos. Menos roteiro, menos slow motion, menos plateia. Amar é mais. Mais arrependimento, mais implicâncias, mais achar que sabe tudo.

Digamos, por exemplo, que aquele certo alguém descobre que você chora ouvindo Roberto. Pronto. Era o que faltava pra que ele começasse a te implicar de novo; afinal de contas, só a mãe dele é careta a esse ponto. E passa a tarde inteira zombando do seu moderníssimo gosto musical.

Quando finalmente se cansa de rir da sua cara, porque uma hora  isso tinha que acontecer; ele volta pra casa e, pela primeira vez na vida, arrisca ouvir só um trechinho do tal Roberto Carlos. Rapidinho. Só enquanto o juiz não apita - pensa. Por incrível que pareça, ele começa a reparar no jeito diferente de Roberto cantar. Um jeito fanhoso e machucante de dizer “Pois é, bicho, sou velharia, mas te faço pensar nela, né, seu babaca”. 
Ele bem que avisou: são tantas emoções.  

E vai brotando um sorriso espremido em meio a um choro sem jeito de sair. Sintomas de  um homem que pela primeira vez ousa deitar no sofá, tapar o rosto com a almofada, ouvir Roberto Carlos e pensar “meu Deus, como ela é gostosa e como é gostoso ser só dela”. Então, surge uma vontade absurda de satisfazê-la de todas as formas, sem que existam motivos plausíveis ou chance de escolha. Uma mistura jamais sentida: d
esejo e ternura. Aí sim. Isso eu deixo você pensar que é amor.

Bem, o pouco que se sabe do amor é que ele está lá. Nota-se pela espontaneidade da ação espontânea e também da pensada, porque pensar pra fazer também é amar, assim como não pensar. É ter dúvidas e não tê-las. Ser íntimo o bastante pra ferir e depois se tornar o próprio band-aid. Controvérsia, poema de Camões.

É antítese, paradoxo, parar de fingir que não ama ou de tentar provar que ama. É fazer de si mesmo e da sua felicidade a própria prova do amor. Bater portas, xingar bem alto. Ouvir palpites e continuar sofrendo mesmo assim, por conta própria, por vontade, por saber que o que parecia ter sido amor, realmente é, até quando insiste em fingir não ser. É saber que essa é a única coisa que aconteceu no passado, mas vive no presente, pois, mexe e vira, vai estar lá, te cutucando, ainda que em forma de lembrança.

Por isso eu digo que amar não é, necessariamente, sair por aí gritando que ama. Isso é ter inveja de Roberto Carlos e também querer exibir o próprio amor. Não é só fazer promessas. Isso é querer um atestado assinado e carimbado para o medo. Não é esperar ansiosamente uma mensagem. Aliás, pode ser que seja. O amor é simples.

É ter consciência de que continuar junto não é garantia de nada e que estar separado pode ser a forma mais certa da aproximação. É conhecido que a convivência o torna mais difícil, que os defeitos do outro o torna menos colorido, e que numa certa hora do ano, ele parece ter acabado. Já dizia Neruda, “para que nada nos separe, que nada nos una”. Gênio. Mas, cá pra nós, amor que é amor se instala e não sai mais, mesmo que não se concretize. É o tal do amor adiado. Ele simplesmente existe, sem casa, sem beijos, sem precisar ser chamado de. Não precisa ser dito, nem acreditado, quiçá registrado com essas quatro letras. Fica assim, sem nome, sem lenço nem documento, vagando entre os olhos, esperando acontecer. E acontece sem ser visto.

É viver abrindo e fechando aspas. Criando e esperando que entendam seus neologismos. É não parar de pensar “eu podia ter acertado, ele podia ter perdoado” ou então, “a gente podia ter brigado, se ofendido, gritado, jogado na cara e depois irmos nos deitar; como dois amantes que brigam, se ofendem, gritam, jogam na cara e depois deitam juntos”, isso tudo porque a gente não liga de se angustiar de vez em quando pensando que o amor acabou. E também porque a gente já sabia mesmo que essas coisas não acabam. É estar disposto a reverter a situação. Agora.

Intolerante como ele só, o amor não aceita as imperfeições do outro. Quem ama exige tudo. Quer mudar uma só pessoa e não procurar qualquer outra que encaixe nos seus padrões. Sabe que amar é arriscado, toma alguns cuidados, mas não hesita em fazê-lo.

É sentir seu amado no peito, batendo bem forte, querendo sair, 
mas o pobre coitado não sai. Está enclausurado, num regime semi-aberto, porém perpétuo, condenado à morte.  É ficar calado e ser ouvido ou então, falar demais, ciente de que o outro nada escuta. Sentir na voz, no olho e até nas mentiras quando é verdade. Amar é lá no fundo sempre acreditar no que é dito entre dois. E mais ainda no que não é falado. O amor é uma espécie de silêncio gritado.

Por fim, digo que ama quem anda lado a lado, pensando que o outro é eterno e que ali, naquele momento, mora a resposta de tudo, sem pergunta alguma ter sido feita. E diz a si próprio: somos a personificação do amor. Ou melhor, nós dois juntos conseguimos ser ainda mais bonitos que o amor.

Afirmo assim, sem pestanejar, com toda convicção, porque amar é achar que sabe tudo, amar é contradição. É não ter, e ao mesmo tempo, ser a própria ilusão.



6 comentários:

  1. Que lindo! Tirado do fundo da alma.
    Tenho certeza.

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  2. gente de deus...a cada texto novo eu me supreendo mais ainda c vc lorranny...eh incrivel...adoro seu blog e seus textos...de vc eu ate q t acho um pouco gente boa..hauhaua...zuera

    Guilherme (Faculdade)

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  3. Ló...
    minha vontade era ficar lendo seus textos sem parar..
    são ótimos..
    esse é a minha cara ne??? rsrsrs

    Beeijos
    Ana Clara

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  4. Arrazou msm Ló...lindo demais o texto!!
    vontade demais de ler e reler cada um dos seus textos!!
    Pâmela

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  5. Ô gente! Como eu adoro ver vcs por aqui!
    Brigada pelos comentários e elogios.

    Ana, sim! Esse é especialmente sua cara!

    Pâmela, difícil é essa facul que nao dá tempo da gente nem ler os textos da coleguinha, neh?
    Mas arruma um tempinho e volta mais vezes, viu?

    Beijão
    Adoro vcs!

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  6. Anônimo disse...

    Simplesmente perfeito Lorraine, Lindo, Adorei.

    Beijos.
    Fernando

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