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domingo, 24 de abril de 2011

Humano, demasiado humano


Filme Balzac - a costureirinha chinesa

Humano, demasiado humano. Recentemente, essa frase de Nietzsche mexeu comigo. É o tema da campanha dos candidatos à diretoria de alguma coisa lá da Universidade. Confesso. Meu voto está sendo perigosamente seduzido pela paixão com que o candidato fala de certas coisas intraduzíveis. Um brinde às humanas! 

Eu fico assim, totalmente enfeitiçada, quando vejo alguém discursando pra minoria entender, principalmente quando se trata de alguém da área de humanas. Quase sempre é um intelectual que assopra verdades disfarçadas de poesia, tentando expandir mais que conhecimentos: um sentimento, de luta, de busca da verdade. Feliz ou infelizmente, existem pessoas que pensam por uma multidão seguidora alienada, desde os tempos de Marx. Conclui-se que esse sentimento não é expansível pela fala; mas sim, captado e absorvido por osmose. Sensibilidade, ou tem ou não tem. Nasce-se virtuoso ou não. É pra poucos, transcendente. Divino! Que o diga Serra. Pobre criatura mal ajuizada. Mas tá,  deixa aí na ata, que isso é assunto pra outro dia.

E é curioso como tudo me intriga. Sábado fui ao Cinema Falado, um projeto da faculdade que nos possibilita assistir aos chamados filmes alternativos. Esses projetos são bons porque mobilizam amantes-acomodados-de-comédia-romântica a conhecerem o mundo cult e suas lições glamourizadas. O último filme foi Balzac – A costureirinha chinesa. Linda história, triste conclusão. Depois de se apaixonar pelo triângulo de protagonistas que simplesmente se amam sem exigir nada em troca, você descobre como um livro transforma uma vida. Isso porque, ao longo da trama, os amigos leem obras de Balzac para a até então analfabeta costureira, que transformada pela quantidade de informações que recebeu, resolve ir para cidade grande em busca de uma vida melhor, abandonando suas origens e as pessoas que a amavam.

Pois bem, essa semana foi de arte, de suspiros e alívios, pois há meses eu não me sentia tão eu. Foi como se eu reencontrasse a antiga pessoa que ainda sou e que dormia um sono pesado desde que não tenho tido tempo pra mim mesma

Porque, veja bem, é preciso ter cuidado. Quando estipulamos metas demais, as obrigações atropelam qualquer coisa que signifique paz na nossa lista de prioridades. A voz de Vanessa da Mata passa a ser só uma voz de Vanessa de Mata, entrando e parando no seu ouvido, sem efeito algum. Viu a gravidade do que é esquecer de si mesmo? Eu estava perdendo essa percepção aguda particular. Esse ouvir o que ninguém ouve, sentir o que ninguém sente, falar o que ninguém entende.

É meio impossível de explicar. Pudera eu abrir minhas vísceras e mostrar a vocês uma corrente de inquietudes e de sossego atravessando por elas. Um apelo para que alguém na multidão me acene, dizendo compreender que quando eu digo coração, amor ou alma, eu estou indo além dos significados finitos impostos. São as tais coisas inexprimíveis. Atos cotidianos de carinho praticados com total desinteresse, sem se esperar nada em troca. Esse é o mais puro de todos os amores, o legítimo. 

Por isso que a simplicidade de uma música, a ingenuidade de um abraço, o alerta de uma propaganda, a falta de luxo de um vento e, por fim, a sensibilidade das humanas me injetam tranquilócitos e limpam a corrupção das minhas veias, nem que seja por alguns minutos. Cenas que de tão fáceis ficam esquecidas na vala da insignificância. Do desmerecimento em relação ao que pensa-se hoje em dia, ser inteiramente explicado pelas exatas.

Não sei se assim acontece com você. Se não for, abstraia, levante a mãos pro céu e fuja o mais rápido possível dessa louca que vos fala. Vai que estou enganada e isso é sim contagioso. Quanto mais longe, melhor. Porque esse tipo de coisa é assim mesmo, ou você entende ou você é normal.

Pode ser o curso que eu faço que trata tanto de pessoas, Nietzsche e seus pensamentos refinados, filmes e seus efeitos inexprímiveis, ou sei lá, talvez seja só eu mesma que ando assim, como sempre, à flor da pele, não sei. O que sei é que, em mim, tem brotado um 
querer incomensurável de mudar o mundo. De salvar o outro, nem que seja  pela minha escrita, nem que seja só por agora. 


Já sentiu isso? É tipo assim, uma vontade perturbadora e inexplicável de fazer jus ao nome com a qual nos classificaram e enfim, ser humano. Ou quem sabe até mais que isso, demasiado humano.  

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Depoimento de uma aluna de medicina que, diga-se de passagem, tem o dom da palavra e do amor, ambos suficientes para cuidar de pessoas, estando ela na área de humanas ou não:


"Quantos de nós, apesar de amarmos a Medicina, queríamos ficar ali naquele campus, sentados embaixo de árvores, discutindo sobre questões metafísicas até perder a noção do tempo? Ficamos olhando admirados para aqueles inspiradíssimos estudantes de Humanas que passavam por nós com seus violões, poemas e cabelos multicoloridos."


                                                                           Rebecca Noguthi - Blog Hemobloguina




obs: Tem tanto tempo que eu vi esse depoimento de Rebecca e guardei no meu computador, e só agora, escrevendo, eu resolvi procurar pelo Google onde foi que eu tinha o visto. Achei. To feliz e queria dizer que, sem dúvidas, também admiro muito a medicina e as exatas em geral. =D
  
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Um comentário:

  1. As palavras constroem, mas também destroem. rs

    ...
    Veja meu post, aqui mando um conto, se gostar, posso contar com o seu "seguir"? =)

    Obrigada!
    http://asphyxiaa7x.blogspot.com/2011/04/sinestesia.html

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